quinta-feira, 19 de agosto de 2010

O PRIMEIRO INSTRUMENTO MUSICAL: A VOZ HUMANA

Estudos arqueológicos mostram que desde a pré-história o ser humano fabrica instrumentos musicais. Mas, muito provavelmente, o primeiro instrumento musical do homem foi sua própria voz. Podemos deduzir através de vários achados arqueológicos que desde que o homem aprendeu a articular os primeiros sons e se comunicar, também aprendeu a cantar e fazer música. Isso porque desde os primórdios da raça humana a música estava associada com rituais religiosos e de homenagem aos mortos. Deduz-se que o principal instrumento musical dessas cerimônias fúnebres era a voz humana porque, além do som musical, a voz humana é o único instrumento que pode articular palavras. Até hoje nas danças rituais dos índios americanos, dos aborígenes na Austrália, dos índios brasileiros e outros povos autóctones, o canto - acompanhado por tambores e chocalhos - é o fio condutor do ritual.

Devido a essa capacidade de aliar melodia (música) e mensagem (palavra), simultaneamente, a voz humana pode ser considerada o instrumento musical mais completo de todos. Por isso, até hoje a música cantada é privilegiada nos cultos religiosos do mundo todo. Além disso, a voz humana consegue fazer um “glissando” perfeito, ou seja, deslizar cromaticamente por várias notas (como no violino). Isso porque a voz é um “instrumento” não temperado, ou seja, sem afinação fixa. Essa característica da voz é, ao mesmo tempo, uma vantagem e uma desvantagem. Vantagem porque podemos cantar qualquer melodia no tom que quisermos. E desvantagem porque, por não ter afinação fixa (temperamento), podemos desafinar com facilidade.

Mas para se cantar com afinação não é preciso ter uma boa voz - como a de um cantor lírico – e sim uma boa audição e sensibilidade para perceber as diferenças de altura (freqüência) entre as notas musicais. Muitas pessoas não percebem que são desafinadas quando cantam, ou que estão fora do tom, porque não treinaram a sensibilidade auditiva quando criança. Outra coisa que afeta a afinação é cantar sem uma boa técnica vocal porque, além da afinação, a voz também possui timbre e volume, que também devem ser trabalhados com cuidado por um bom profissional para não danificar o aparelho fonador.

SURDEZ TONAL

Como vimos, qualquer pessoa pode cantar com afinação, desde que tenha boa audição. Os chamados “musicalmente surdos” ou “surdos tonais” são raros. Várias podem ser as causas da surdez musical, mas a principal delas é uma acentuada diplacusia. Esse têrmo se refere a uma diferença na captação das freqüências entre os dois ouvidos, ou seja, um dos ouvidos percebe o som com uma freqüência mais alta ou mais baixa que o outro. As duas freqüências são “misturadas” pelo cérebro, causando uma percepção errada da freqüência original. Isso ocorre porque temos um labirinto (órgão de audição interno) para cada ouvido, e os dois labirintos não têm exatamente o mesmo tamanho, já que a simetria “espelhada” do corpo humano não é perfeita. Quando a diferença de tamanho entre os dois labirintos é maior que a média, a pessoa tem dificuldade ou impossibilidade para cantar no tom.

Como já explicado acima, a simetria do corpo humano não é perfeita, logo, todo mundo tem diplacusia. O que acontece é que esta pode variar de indivíduo para indivíduo. E o único modo de alguém saber o quanto é diplacúsico, é fazendo um teste de audiometria, com um(a) fonoaudiólogo(a), num laboratório equipado para isso. Quando uma pessoa tem os labirintos quase idênticos no tamanho e no comprimento das espirais, podemos dizer que essa pessoa tem facilidade para distinguir as diferenças de altura entre as notas musicais. Já no caso de uma diplacusia acentuada, quando alguém tem labirintos com tamanho e comprimentos bem diferentes (visíveis somente com microscópio), a pessoa terá dificuldade (ou até impossibilidade) para reconhecer e/ou cantar as melodias tocadas. Por causa disso, dizemos que essa pessoa é “musicalmente surda”, ou tem “surdez às tonalidades”.

Por isso não concordo com a expressão “talento musical nato”. Melhor seria dizer que alguém nasceu com “boa percepção para música”. Considero discriminatório o têrmo “talento”, pois qualquer pessoa com o mínimo de percepção pode fazer música, ou qualquer outra arte, desde que tenha também sensibilidade e desejo de extravasar seus sentimentos. O resto é estudo e treinamento. Qualquer artista sabe disso. O verdadeiro talento vem do treino disciplinado. Do mesmo modo, ninguém nasce com o chamado “ouvido absoluto”, ou seja, a capacidade de cantar na tonalidade certa, ou identificar a altura de uma nota musical, sem nenhuma referência tonal prévia. Essa capacidade só se alcança com muito treino, e quando a pessoa tem diplacusia reduzida. Mesmo assim quase todo mundo pode cantar afinado com certa facilidade. Basta treinar técnica vocal com um(a) bom(boa) professor(a).

“QUEM CANTA SEUS MALES ESPANTA.”

Todo mundo conhece esse ditado popular, aparentemente tão banal, mas o que poucos sabem é que ele contém uma sabedoria muito antiga e exata, que deveria ser praticada por todos que queiram se manter com boa saúde – física, mental e emocional. Muita gente não sabe o que o canto pode fazer pelo corpo. Por exemplo: cantar – com boa técnica, usando o diafragma corretamente – relaxa o corpo e promove uma massagem nos órgãos internos que pode até ajudar na prevenção (ou até a dissolução) de cálculos renais, ou obstruções na vesícula (quando ainda estão em estágio inicial). Isso se dá pela ressonância, quando cantamos sons agudos, que vibram justamente no tronco, quando esses sons estão bem apoiados pelo diafragma e pelos músculos abdominais. Afora isso, cantar é um excelente exercício aeróbico, podendo ser tão cansativo quanto uma aula de aeróbica. Basta lembrar que cantores de ópera precisam se alimentar com carboidratos antes de uma apresentação, pois gastam muitas calorias enquanto atuam, chegando a perder dois quilos numa única noite.

Em comparação ao canto popular, a emissão vocal operística é muito mais desgastante, já que exige um esforço e um controle respiratório muito mais intenso, com inspirações rápidas e muito volume sonoro na emissão vocal – na ópera o cantor projeta sua voz sem microfone (a não ser que o recital seja ao ar livre, onde não há acústica favorável). A voz ganha volume nas cavidades de ressonância do tronco (pulmões e traquéia), pescoço (a laringe) e cabeça (boca, cavidade nasal, seios frontais, seio esfenoidal e calota craniana). Logo, é o corpo do cantor(a) de ópera que amplifica o som. Mas não é necessário que ele(a) seja imensamente gordo como muitos pensam. Basta lembrar que o excelente tenor espanhol José Carreras (com um metro e setenta de altura) consegue rivalizar em volume sonoro com seu colega Plácido Domingo, que mede quase 1,90 m e é bem mais encorpado. O que faz isso acontecer é o uso eficiente de uma boa técnica vocal.
Siegfried Klein Martins – prof. técnica vocal
Tel : (21) 8445-5078 ou 2295-1104

Um comentário:

  1. excelente artigo, quando se pesquisa na internet a respeito desse tema somos bombardeados de bobagens sem fundamento histórico e cientifico. Parabéns pela publicação

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